30.3.07

Lente de aumento

A realidade está por trás dos olhos de quem vê – e não adiante, na cena iluminada pela lente da mente. É a parte mais visível da ficção, para Affonso Romano de Sant’Anna.

A ficção, nem sempre exposta, espontânea, no real, encobre o palco do mundo aberto a cada um. Do meu ângulo ou do teu, vemos porções de um cenário cuja totalidade sempre nos escapa.

Daí a função do que inventamos para preencher as lacunas daquilo que mal enxergamos. O desejo de saber é extensão inexorável do olho. Mas se o olho é frustrado, se fecha, e dá asas à imaginação.

De Platão a Matrix, os limites da realidade são transpostos pela razão – que filosofa ou fantasia, angustia-se ou se diverte de acordo com a distância em relação aos pontos que servem como cardeais.

Em uma parada qualquer entre a loucura e a lógica, a ficção é uma rota de fuga breve e leve. O mundo fictício é tão real que soa melhor que a realidade – tanto mais quanto os fios do real se confundem num emaranhado de imagens, meios e mensagens.

Possibilitada pelo caos de onde irrompe a ordem, pelo silêncio do qual emerge a fala, a ficção nos fascina ao ponto de parecer maior que a sua própria origem.


Lucia e o Sexo (Lucía y el sexo, Espanha/França, 2001)
Direção: Julio Medem
Com Paz Veja, Elena Anaya e Najwa Nimri.