18.6.08

Do amor que se deseja

Se pudéssemos matar em nós a morte que nos mata – viveríamos mais?

Ele nem pensava nisso. Antes de matar a morte que lhe mata tentaria afastá-la da dela, na esperança de que ao menos enquanto estivesse por perto ela estaria segura.

E se para preservá-la tivesse que fazer mais, aumentando a força que os atrai até o limite da resistência? Não hesitaria. Crer na atração é descrer que haja limite. Preservá-la seria saber que resistia, e sabê-lo seria preservar-se, resistir junto.

Mas a permanência cobra tarifa. A do sonho romântico é o realce da impossibilidade... Um sonhador francês já descreveu o arco patético do ciúme em face do alcance mínimo dos corpos como algo fadado ao desespero. Só que eles não leram, ou não se importaram com as minúcias românticas de Proust. De corpos intactos e intácteis, incapazes de se tocar, reescreveram a história dos que desfrutam e padecem de amor perfeito, em que a paixão não recua nem o desejo se sacia.

O tom de paradoxo não descolore o estranho apelo neoromântico. Em seu amor transparente, a impossibilidade recua diante da ternura, a infelicidade típica dá vez a uma alegria convicta: a alegria dos que têm ciência de que não podem ser mais próximos do que são. Nessa distância que não se quebra – nem é expandida – a utopia particular dos amantes impossíveis se forma.

Era como se o poder da vida e da morte selasse uma antiga promessa que se cumpria enquanto não se consumasse. A ressurreição dela não implicava senão a relativa renúncia de ambos ao amor que não se sepultava, diante da recuperação de uma beleza conjugada que julgavam para sempre perdida.

Se podemos viver em nós a vida que vem de fora – sim, vivemos mais.


Pushing Daisies (1ª temporada, EUA, 2007)
Criado por Bryan Fuller
Com Anna Friel e Lee Pace.


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