7.7.09

A verdade ideal

Como você inventaria o que não existisse? Como entenderia ao cruzar no meio da rua com uma idéia perfeita? Nem tudo que se idealiza é pleno desejo, ou reflete somente o plano polido do espelho.

Ela é aquela que você vê, mas seu vislumbre ultrapassa o conceito da visão. Porque ela é, pra você, bela e sublime. A beleza dela lhe parece o mero conduto do que não se exprime sem se perder, e não se percebe sem um grande susto.

Ela lhe perturba, e por perturbá-lo assim tão claramente é que a existência dela lhe confronta. Você percebe e se assusta. Você pára e escuta, na esperança de que a ilusão se revele, e se revelando, fuja. Mas no íntimo você não quer a fuga, quer o oposto da fuga.

Um senso de realística eternidade toma conta de você ao estar na presença dela, e você imagina o quanto seria bom e fácil e simples respirar a mesma atmosfera que ela por mais vezes, até por muitas vezes mais. E se isso transparece, ela apenas acha graça no momento em que você, crente que vivencia o eterno, não se dá conta de que seus braços e pernas viram mil braços e pernas e não decidem aonde ir. Ela acha engraçado o seu desalinho, sem sorrir, pois pouco importa: aquele é seu instante, não o dela, a sua eternidade, não a dela.

Ela não é fruto de sua imaginação – ela se transforma no fruto mais doce da sua imaginação a cada encontro, por mais fortuito, breve que seja.

Você imagina que esses encontros podiam depender menos do acaso. Que a sensação de eternidade que lhe toma junto dela abandonasse o realismo maluco que enlouquece, assumindo a leveza de um dia comum. Que o sorriso dela não fosse a estrela que explode irradiando luz e energia que você presencia num lance de sorte, e sim, a chama da fogueira ao seu lado, à noite.

Imagina os olhos dela prestando atenção em algo que pode ser dito uma extensão sua. Imagina os olhos dela prestando atenção no que ouve enquanto você lê. Imagina os olhos dela buscando no vazio uma ligação com o que você pensa, mesmo que você não tenha nunca como saber.


A mulher invisível (Brasil, 2009)
Direção: Cláudio Torres.
Com Selton Mello, Luana Piovani, Vladimir Brichta e Maria Manoella.


2 comentários:

Felipe Liberal disse...

Você escreve muito bem!

Anônimo disse...

parabens. bela análise.

abraços..

leandro.