27.6.10

Viajo porque preciso voltar




Entre rochosos acúmulos e jardins perdidos, o viajante encontra o sentido da jornada na volta.

A pedra e a flor são metáforas do ser abandonado a si próprio – feito a pedra que rebenta à superfície, ou a flor por um segundo solidificada.

A lentidão geológica do desabrochar da pedra não é captada pelo olho humano. Contentamo-nos com vestígios morfológicos de milenares mudanças. A sedimentação em camadas guarda o que resta de um longo processo, imperceptível de tão longo. A duração, porém, é o que transforma e liberta a pedra.

Em contraste, a fugaz beleza das flores faz com que elas pareçam eternas de tão belas. A flor é perenizada quando se abre. Como se nenhuma outra imagem valesse o que vale a flor em plena forma. A flor pronta. Apesar do conhecimento de que até a flor passa, foge, de que aquele estado de perfeição não dura, a flor ideal permanece, quase mítica, enquanto outra flor não vem, renovar a mesma eternidade.

Entre rochosos acúmulos e jardins perdidos, o road movie estanca o movimento. Acelera a espera do devir. E avisa que é preciso voltar para completar a viagem. Qualquer viagem. A eternidade na estrada não passa enquanto a vida vai e não volta.

O movimento contínuo, inercial, suscita a vontade de esquecer o que não pede pra se lembrar. A canseira da paisagem mutante à beira da estrada, à beira da janela, entorpece o olhar que não sai do lugar.

A viagem não possui uma perna só. Nem responde ao sonho da aventura sem destino. Toda viagem tem ida e volta – aquela que somente vai é partida.

Seja para os que vão para escapar, seja para os que vão para buscar – como distinguiu Érico Veríssimo – há um retorno, ainda que impreciso, a algum lugar bem conhecido, na conclusão do viajar.

Como se o fim, antes do começo, despertasse o viajante, provocasse o primeiro passo.



Viajo porque preciso, volto porque te amo (Brasil, 2009)
Direção: Marcelo Gomes e Karim Aïnouz
Com Irandhir Santos.

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