No limbo da indistinção, enquanto o virtual é luminoso, limpo e respira estilo, o real é obscuro, sujo e feio. A virtualidade se move como um raio, explode quando o real dorme, imóvel. E o que se move não existe.
Na pancada do ciberpunk, a virtualidade é planejada como um sonho, e o onírico é alçado ao status de coisa real. O real de fato, improvisado como pesadelo, esconde-se num porão. Na mesma batida, o “despertar para a iluminação” prega a mentira objetiva do que há, o falso que estaria impregnado em tudo descrito como material. Pois a alma não é virtual? A salvação também tem que sê-lo.
A salvação futurista quer redimir o pecado pré-histórico... No entanto, se o futuro mente, a verdade ficou para trás, como profecia irrealizada.
No mundo da causalidade projetada, a escolha é uma ilusão definida – V ou F, violência ou escravidão, fraqueza ou liberdade, alienação ou força. Como se fôssemos o objeto de uma decisão, sujeitos de nenhuma. Você é escolhido, mas não escolhe, a não ser que decida virtualmente. As escolhas são portas, uma atrás da outra, que não podemos saber aonde vão nos levar.
Sem acidente, sem acaso, o saber é um jogo de poder violento e falacioso. No mito platônico, por exemplo, as aparências das sombras no fundo da caverna mundana só não enganam àqueles que vencem a mentira através de uma longa jornada de descobertas e autoconhecimento. Mesmo assim, Platão ainda é o melhor precursor do universo virtual, com seu plano de “formas” essenciais, inatingível para a percepção humana.
Daí a pergunta no devir matricial: a profecia é uma questão de tempo? Ou de esperança? Se a consciência fosse a ilusão da consciência, engano de si mesma, como iludir-se, em primeira instância? Os antigos e os novos pregadores de uma realidade ausente, como bons ilusionistas, não desmentem – a verdade virtual não se manifesta, prefere ficar em aberto.
A resposta, claro, está dada, na mentira que se disfarça ao se atirar para longe.
The Matrix Reloaded (EUA, 2003)
Direção: Andy e Larry Wachowski.
Com Keanu Reeves, Carrie-Anne Moss e Laurence Fishburne.
Um comentário:
Interessante texto, Fábio!
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