De um ponto de vista externo, o apaixonado está quase sempre enganado. Aquilo que lhe aparece não é bem o que parece, aquilo que sente não é tudo, e aquilo que diz não é só o que devia dizer. Há muito mais para notar e explorar do que supomos quando somos monotemáticos.
A restrição do significado – o universo cabe na luz de seu rosto, no som de sua voz, na presença de seu corpo – é o maior engano. O chão que some sob os nossos pés ou se apresenta como nunca antes, com tal solidez, tem o piso falso. E sabemos disso. Eis o pior. Tudo faz tanto sentido de uma hora pra outra que não pode estar certo, seria fácil demais. Seria bom demais: sem coisas incompreensíveis, sem perigos ameaçadores, sem qualquer sombra por perto.
O que não limita à mentira o objeto valorizado pela febre amorosa. O engano das paixões não as torna erros puros – assim estaríamos cometendo, aliás, o mesmo erro duas vezes (e de fato, cometemos, várias vezes). Mas se há mais do que o equívoco, é talvez porque seja algo essencial, exposto à falsificação. Algo cuja descoberta muda o mundo aceito e replicado no modo monótono da existência. Que ironia – a paixão monotemática retira a razão da monotonia...!
De onde vem, como surge e como some a essência das paixões é um mistério cujo deciframento pode não nos interessar. Basta-nos saber que a essência oculta dá-nos a graça de ser ativada e esmorecida em pontos diversos da vida.
A pressa dos apaixonados, descabida para os que espiam de longe e juram conhecer de cor o enredo farsesco, é pressa justificável. Pois é preciso se atirar à experiência da paixão, antes que a febre recue, o delírio passe, a maré avance e derrube a construção delicada, perfeita, de beleza esculpida sob medida na areia do acaso.
Amor sob medida (The best man, Inglaterra/EUA, 2005)
Direção: Stephan Schwartz
Com Seth Green, Stuart Townsend e Amy Smart.
2 comentários:
Como tudo de bom que você faz.
Salve.
obrigada pelo comentário, fábio!
não, não sou parente dele...
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