24.8.10

Minha água, meu esgoto




Editorial do Jornal do Commercio

Está faltando terreno infraestruturado na Região Metropolitana do Recife, para fazer deslanchar no Estado o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida. A constatação de empresários das grandes construtoras pernambucanas e de diretores da Caixa Econômica, que financia o programa, reunidos no Sindicato da Indústria da Construção (Sinduscon), antecipou a exposição de uma realidade reforçada esta semana pela divulgação de pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): 56% das residências, ou 32 milhões de unidades habitacionais, não têm ligação de esgoto no País. A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, com dados de 2008, aponta Pernambuco com média abaixo da nacional, possuindo cerca de 27% dos municípios com tratamento de esgoto, contra 28,5% do Brasil. No Ceará, exceção no Nordeste, o índice é melhor, e chega a quase 49%. O levantamento indica ainda a distribuição precária de água no Nordeste, onde 40% das cidades precisam recorrer ao racionamento, e a vexatória situação de metade dos municípios do País, que atiram seus resíduos sólidos em lixões a céu aberto.

A falta de infraestrutura explica, em parte, o frágil desempenho do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no setor de habitação. Levantamento do site Contas Abertas divulgado na última sexta-feira mostra que apenas 5% das obras previstas desde 2007 foram concluídas. Em Pernambuco, o desempenho é ainda pior – minguados 2% do cronograma previsto foram cumpridos. A exigência da Caixa para financiar os projetos habitacionais esbarra na deficiência estrutural que inviabiliza a equação econômica, adiando por tempo indeterminado o sonho das famílias aprovadas em programas como o Minha Casa, Minha Vida.

Os números provam que falta planejamento e bom senso na gestão habitacional brasileira. Pelo menos desde a época do Banco Nacional de Habitação (BNH), são lançados programas de forma incompleta, focados em áreas desprovidas de condições básicas de distribuição de água, energia, rede de esgoto, acessos viários e linhas de transporte coletivo. O resultado desses programas foi a favelização, seguida do abandono e até das ruínas dos conjuntos erguidos. Tais coisas – minimizadas pelo gestor público nos momentos festivos das metas programáticas – constituem a essência da vida urbana: o que vai fazer o cidadão numa casa sem água, sem esgoto e onde não passa nem um ônibus? A urbanização é um pressuposto da habitação, e não um complemento.

No caso da Região Metropolitana do Recife, a ausência de espaços apropriados para o investimento habitacional termina onerando a construção. As estações compactas de tratamento de esgoto e a movimentação de terra necessária em topografias acidentadas, por exemplo, são custos que não estão incluídos no programa. A nossa metrópole requer a urgente conformação de áreas planejadas para habitação popular – de preferência, nas proximidades do Complexo Industrial de Suape, da futura Cidade da Copa, e para as bandas de Paulista e Igarassu, possibilitando assim novas concentrações demográficas ao norte, a oeste e ao sul da Região Metropolitana.

A previsão sombria da Organização das Nações Unidas (ONU), feita no 5º Fórum Mundial da Água, em 2009, foi de que dois terços da população mundial não contarão com saneamento em 2030. Para forçar os governos a tratarem seriamente do problema, a ONU aprovou resolução, em assembléia realizada no mês passado, que considera o acesso à água e ao esgotamento sanitário como um direito humano essencial. O governo brasileiro deveria aproveitar a deixa e lançar outro programa, de prioridade mais alta e como pré-requisito para destravar o Minha Casa, Minha Vida – seria o Minha água, Meu esgoto, com vistas à democratização de um bem cada vez mais escasso no planeta. Sem a conscientização política do papel da infraestrutura básica para a diminuição do déficit habitacional, zonas urbanas saturadas como a Região Metropolitana do Recife continuarão a ser problemas sem solução para a expansão da moradia – uma questão crucial para a qualidade do desenvolvimento que desejamos para Pernambuco.

Foto: capibaribe.info

Um comentário:

Anônimo disse...

Por que nao:)