9.10.06

Cumprindo prisão perpétua


Há finalidade no ato libertino? O que persegue? A felicidade? A virtude? O ato libertino é escravo daquilo mesmo que pretende negar, denunciar, afrontar ou destruir – e a libertinagem não traz prazer, nem ganhos. Sua motivação é tão obscura quanto o alvo de seus ataques: o mundo.

Na ânsia pela diferença não há desejo de originalidade... Pelo contrário, no máximo ali dormita a vergonha de ser igual. Parte indiscernível do deplorável, do mundo que lhe causa nojo, o libertino manifesta a melancolia que o consome, e o faz explícita e escandalosamente, por diversão ou necessidade.

Mas então a fuga do tédio poderia ser o bem almejado? Poderia. Desde que alguma alegria abrisse uma réstia de luz em sua alma sombria. O tipo retratado aqui, contudo, é triste antes, durante e depois do gozo. O êxtase não lhe diz nada. Por isso o transforma em gozação, na velada esperança de que o gracejo, a imitação, o ridículo terminem de extrair qualquer sentido da existência fadada a uma auto-referência sem graça.

Para azar seu, a dor tampouco é resposta. O masoquismo está fora de seu alcance. Como a pele insensível ao fogo, a alma libertina busca na luxúria, no grotesco, na privação da consciência, a razão de liberdade sentida como prisão.

A vida em essência é insana, torpe, feia, e toda ação, toda palavra, são irrelevantes, quando se está condenado perpetuamente ao próprio ponto de vista.

O libertino (Inglaterra, 2004)
Direção:
Laurence Dunmore
Com Johnny Depp e John Malkovich

Um comentário:

Anônimo disse...

O ato libertino tem a si próprio como fim, assim como o ato de amar. E vivem segundo o princípio da não-contradição: aniquilam-se mutuamente. Ambos provocam a dor. Ambos nos condenam.