23.12.07

Simbiose

No resguardo do ser animado e posto em moto próprio resiste o tecido mágico, isolante e interativo, anteparo e continuidade do mundo. Tecido formado por células que trabalham, poros que filtram, genes perpetuados. De magia nem sempre discernível no lusco-fusco de coisas fechadas para as quais parece não surgir nada.

O estranhamento do corpo libera pensamentos metafísicos que podem ir do pânico ao nirvana. Tomado por embalagem da alma, o corpo aprisiona um ente convulsivo que não se culpa ao pretender, nos piores e melhores momentos, “sair de si”.

Diante de outras embalagens – de idêntico conteúdo? – prisioneiros e iluminados têm que “sair”. É um movimento complexo, duro de entender. Movimento involuntário, quase sempre, deixando o espírito (conteúdo) embatucado.

Porque os corpos animados em torno do nosso constituem alvo de fascínio ainda maior, extensão daquele provado pela mente ao se descobrir habitante de matéria igual: montada com os mesmos átomos, na arrumação fundadora de realidade única, no tempo comum.

A saída supõe a chegada. Encontros viram desencontros. Azar e sorte se alternam na perspectiva de indivíduos que se esbarram enquanto seus corpos existem. Neuroses e paranóias aproveitam para se instalar no intervalo, nas frestas do desencaixe, nas cicatrizes mal fechadas.

O indivíduo livre devido à solidão radical do corpo deseja o fim da solidão e a abdicação da liberdade. O indivíduo anseia por utópica simbiose. Quer dividir a matéria animada – o corpo em que vive – como divide o mundo forjado e ocupado pelo pensamento.

Mas a relação simbiótica não voga para os da mesma espécie. A necessidade do outro é indireta, complementar, apenas simbolicamente vital – ou seja, em termos humanos, necessidade concreta e indispensável. De sobrevivência? Talvez não. De comunhão das impressões que atravessam as embalagens corpóreas, certamente.



Invasores (The invasion, EUA, 2007)
Direção: Oliver Hirschbiegel
Com Nicole Kidman e Daniel Craig.

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