Toda beleza é
momentânea, desafia o instante,
insinuando a duração utópica que desponta no belo
Dias atrás, a notícia de reabertura das investigações sobre
sua morte ganhou destaque na internet, na TV e nos jornais do mundo inteiro.
Assim, trinta anos depois de deixar-nos, sua lembrança meiga mais uma vez nos
arrebatou. O retorno à mídia provocou uma avalanche de acessos e exibições de
poses regatadas. O brilho de Natalie Wood estava de volta. Uma multidão de
olhares foi atraída pela imagem desaparecida há tanto tempo, como se algo de
eterno pudesse, através dela, ser vislumbrado.
Pena que a imagem recuperada não recupera a beleza perdida,
assim como a atriz que salta do baú midiático não pode ser devolvida ao
convívio de fãs, dos amigos e da família. Reforçando a afirmação proustiana de
que a beleza das criaturas humanas é diferente da beleza das coisas, o retorno
de Natalie Wood às telas e às manchetes também serviu para ressaltar que a
imagem da beleza é a beleza imaginada. Foi por via da imaginação ideal da forma
feminina, ainda encontrada nela, que bastou se atiçar a memória do público – e a
curiosidade dos que não a tinham visto antes – para que emergisse facilmente a
admiração recordada de sua graça. Um encanto antigo, reaceso, um deslumbramento
coletivo, mediado e multiplicado, repartido feito pão aos famintos do belo.
Decerto o motivo do reencontro desperta a nostalgia em torno
da estrela de Holywood. E quem sabe a nostalgia de uma época mais simples, em
que a aparência ideal não sumisse num emaranhado de máscaras – e faces tão
preparadas que parecem mascaradas, ansiosas, à espreita de luz e atenção. Mesmo
que ambas, quando cheguem, raramente primem pela permanência.
Apesar da ilusão, o fato é que nem as deusas do cinema
recebem o dom da beleza eterna. Toda beleza é momentânea, desafia o instante,
insinuando a duração utópica que desponta no belo. Tentar reprisá-la é tentar
reeditar o instante que ficou para trás. Por sua vez, a mimetização imagética
recorre à união da memória com a imaginação, à melhor maneira platônica.
Novamente Marcel Proust: a beleza não é senão uma série de hipóteses.
Acreditamos hoje que Natalie Wood era linda, e dificilmente
pensaremos o contrário ao mirar suas fotos e seus filmes. Mas a beleza da
imagem está menos no que revela, e mais no que sugere. A beleza que está além
da imagem – e se inscreve no campo de visão de uma verdade que se oferece –
compartilha o alcance dos olhos com o desfrute do tempo vivido. O que é algo,
por enquanto, impossível de reproduzir.