Soldados americanos no Iraque: a linha da insensatez
Levou mais tempo do que o candidato Barack Obama esperaria
do presidente Obama: mais de oito anos depois de iniciada, e decorridos três
quartos do primeiro mandato do democrata, a ocupação militar do Iraque pelos
Estados Unidos chega ao final. Alvo de crítica ácida na campanha presidencial
norte-americana de 2008, e de praticamente todas as nações do mundo desde o
princípio, em 2003, sob o apoio do ex-presidente George Bush, filho, do
primeiro-ministro britânico Tony Blair, e a desaprovação da maioria da plateia
global, a presença de tropas estrangeiras em território iraquiano deixou um
saldo de quase 120 mil mortos, dos quais apenas 4,5 mil americanos. Cerca de
1,5 milhão de refugiados foram criados. Sua maior serventia parece mesmo ter
sido econômica: a de manter os contratos milionários da indústria bélica dos
EUA, que totalizaram, na menor das estimativas, a bagatela de US$ 800 bilhões
em gastos, ou próximo da média obscena de US$ 100 bi por ano. Há quem faça a
conta de que a guerra não saiu por menos de US$ 1 trilhão.
Muito longe de atingir os objetivos de pacificação e
estabilização prometidos por Bush, a retirada das tropas é quase a capitulação
melancólica de uma potência bélica que, de outro modo, poderia se considerar
desocupada. O ataque verbal ao uso da força como estratégia de política
diversionista foi veemente em 2008 pelo então candidato à presidência Obama,
que chegou a chamar a situação no Iraque de “guerra estúpida”. Infelizmente,
uma vez no poder, Obama não teve força política para impedir que a estupidez
continuasse ao longo dos últimos três anos, ceifando vidas e semeando o ódio de
maneira insana e desnecessária.
Bush aproveitou-se do clima tenso causado pela derrubada das
Torres Gêmeas do World Trade Center, em 2001, para invadir o Iraque sob o
pretexto de que Saddam Hussein abrigava a Al Qaeda e escondia armas químicas de
destruição em massa. Nenhuma arma desse tipo foi encontrada. A deposição de
Saddam não levou calmaria ao país. Pelo contrário, incitou a desavença entre
grupos que se sentiram mais próximos do controle, devido à ausência do ditador.
A partir daí, o discurso oficial ianque abraçou o mantra da pacificação
interna, que até hoje não foi alcançada. Em 2007, no auge desse discurso, um
ano antes da campanha presidencial que elegeria um Obama opositor da ocupação,
os EUA tinham 170 mil soldados espalhados em mais de cinquenta bases no Iraque.
O cheiro de sangue foi intenso, mas a ordem propalada perdeu para o caos que os
invasores ajudaram a instalar.
Como chefe de Estado, Obama divulgou mensagem em agradecimento ao sacrifício de milhões de homens e mulheres durante tanto tempo. Pela contundência do ex-senador na época em que a Casa Branca ainda era um sonho, é plausível imaginar a decepção do presidente americano com a demora em conseguir cumprir a própria promessa. Quando assumiu, havia 150 mil soldados no Iraque, e o número veio decaindo até a última leva, de 40 mil. A retirada teria que se feita em termos responsáveis, justificou Obama. Que seja uma vitória definitiva do bom senso sobre a estupidez.
Editorial do Jornal do Commercio, 5/1/2012.
Foto: Anja Niedringhaus/AP
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