4.1.12

A pauta dos vereadores


O direito à informação pelos cidadãos é tão constitucional
quanto o aumento de salário dos parlamentares


Era tão certa a polêmica, que a direção da Câmara escolheu votar e aprovar o aumento salarial de 62% para os parlamentares da próxima legislatura, a partir de 2013, nos estertores de dezembro, a um passo do recesso, na esperança de ficar a muitos passos da reprovação pública. Mas em tempos de redes sociais, o tiro de esperteza pode ter saído pela culatra. Ainda que o cálculo do desgaste tenha levado em conta o calendário de festas e de férias para minimizar a chiadeira, a reação nos meios de comunicação – incluindo a internet – elevou o tom da indignação acumulada, apenas alguns dias depois do escandaloso auxílio-moradia retroativo dos deputados estaduais vir à tona.

Nos dois casos, sobressai o distanciamento da transparência e da firmeza na defesa de posições, quando se trata de interesses particulares embutidos no interesse de grupo. Os poucos que se manifestam apelam para a legalidade do recebimento dos recursos, parecendo fazer-se de surdos perante o grito dos que reclamam. A controvérsia do legal acima do moral é antiga, e não conduz a lugar algum, além do beco sem saída da decepção e do desencanto que joga os políticos num mesmo saco de baixa valia. Nesta perspectiva, o espírito corporativo na política é tão daninho quanto em outras atividades, com o agravante de bater de frente com o interesse coletivo, o qual suas excelências são pagas para servir em primeiro lugar.

Se o aumento de salário de cerca de R$ 9 mil para R$ 15 mil é legítima e democrática, como qualificou o vereador e ex-presidente da Câmara, Múcio Magalhães, por que proceder à sombra, sem trazer os números e a justificativa de maneira franca e honesta para o conhecimento e manifestação da população? Democracia à sombra lembra autoritarismo, configura prática obscurantista que em nada honra a tradição da política pernambucana.

Enquanto a Lei Orgânica do Município assegura aos vereadores o direito de fazer jus à remuneração de até 75% do que ganham os deputados estaduais, o cidadão comum tem o direito de opinar sobre a questão, inclusive opondo argumentos ao reajuste salarial máximo, no limite do teto. Aliás, o direito à informação é tão constitucional quanto o aumento máximo de salário possível dos parlamentares, e um não deveria prevalecer ao outro. É por isso que a indignação crescente tem gerado ampla repercussão, até com abaixo-assinado virtual em favor da anulação da medida. Em dois dias de circulação nas redes sociais, o documento ultrapassou a marca de cinco mil nomes, e deve ser encaminhado nos próximos dias para o Ministério Público.

Apesar da repercussão negativa e do equívoco indefensável da manobra dos vereadores, é preciso separar a função do Parlamento de eventuais descaminhos trilhados por seus momentâneos integrantes, como ressalvou o cientista político Michel Zaidan, na última quarta-feira, em entrevista a Aldo Vilela na rádio CBN. Quem sabe, no retorno ao trabalho, a pauta da cidade volte à pauta da Câmara, para que o salário de detentores do voto não abra o ano eleitoral como motivo de generalizada descrença.

Editorial do Jornal do Commercio, 04/01/2012.

Foto: Roberto Pereira/D.A Press

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