28.10.07

Poética do corpo

A dança desenha sentidos simples para quem olha e sente o que vê.

O avesso da dança é o silêncio vestido com frases que se calaram e deixaram ausente o movimento.

Almas em cárceres tão amplos que vão além do horizonte podem se dar ao luxo de negar a dança e sua potência. A cor do mundo, com freqüência, desbota diante da única forma que cambia impressões sobre as demais. Mas a escuridão reinante desfia junto se o que anima a busca some da vista. Há múmias mais vivas do que isto.

O que nos anima? Quase nada. Quase sempre um tênue reflexo. Um olhar desata o gesto invisível perdido e reposto em cada passo ou no menor esboço de mudança no rosto, de si, de alguém. Olhares se cruzam pelo caminho. O caminho das cruzes do olhar.

São as paixões dispersas no palco que contam melhor o instante, do mistério transmitido de dentro para fora, que se transcende na contramão. O instante é a eternidade, de repente real.

A poesia não precisa ser dita? Tem que ser ouvida a poesia! Ainda que vague por nanodutos frágeis para todos os lados, sem direção, em um “caniço” arrogante e inerte.

A poesia no abismo de luz ao fim do percurso é o moto perpétuo jamais pensado, indispensável, chave de um segredo encoberto pelo próprio pensamento.

No animal consciente, o exposto não se impõe fácil.

O explícito pede espelhos. Imagens imploram por palavras. E o que é dito requer o esconderijo das últimas aparições.

Matemático e belo balé que se repete.

Para a contemplação muda.

Para a narração contemplativa.

Para o amor em plena forma de poesia.


Fale com ela (Hable com ella, Espanha, 2002)
Direção: Pedro Almodóvar
Com Leonor Watling, Javier Câmara e Dario Grandinetti.

15.10.07

Estrela cadente

Um amor ideal não se realiza, assim como não se projeta um verdadeiro amor. É contraditório o espírito romântico, e o tempo só faz piorar a situação, na esperança que desespera, no silêncio do que termina.

A esperança – na linda e singela definição contida no romance A mulher de costas, de Márcia Tiburi – é um medo verde, brotado no peito dos que têm paixão. Medo que finde o nem começado, medo colado ao desejo de completude a luzir nos olhos de quem ama.

Aliás, Márcia escreve como quem filosofa, e filosofa como quem conta estórias. Durante o programa Saia Justa, do canal GNT, exibido na semana passada, ela resumiu numa sentença a mudança nas relações amorosas – transição pós-moralista, quiçá pós-romântica – que nos afeta.

Uma mulher que mora sozinha perguntou que espaço deveria reservar para o namorado em sua casa, sem perder a privacidade e o prazer da relação. Tiburi foi clara e distinta: “O seu corpo, apenas, e nada mais”.

A resposta foi ilustrativa do novo mundo amoroso que germina, a partir de um novo e bem-vindo protagonismo das mulheres. Na tradição romântica, o corpo do outro é exatamente aquilo impossível de ocupar.

Para fugir do impossível, o romântico tradicional pensava noutra coisa, e arrumava impossibilidades maiores. Marcel Proust, ao tratar da insuperável ansiedade dos apaixonados, chega a dizer que a sua busca são todos os pontos do espaço e do tempo já ocupados e ocupáveis pelo corpo da figura amada.

Daí o ciúme como extrato obrigatório da cultura do amor romântico. O ciúme é o que aparece junto com a prisão da utopia (e a utopia da prisão).

Na época pós-moralista – longe da superação do moralismo, que resiste e se reinventa, como observa Gilles Lipovetsky – o corpo é tanto a conquista quanto o limite da nova ética amorosa.

Para o sofredor romântico, o corpo do outro é menos objeto e mais imagem, menos real do que fruto de uma idealização – já que o que sobra é a fantasia, ante a ausência da concretização. Inclusive a fantasia dos ciumentos, diante do desejo impossível de talhe proustiano.

O corpo do outro, no romantismo clássico, é feito estrela cadente riscando mais a imaginação que o céu. É romantismo da alma: da essência intocada e intocável, que faz do outro um deus, e o aprisiona, em reverência e vigilância.

No romantismo que desponta, o romantismo do corpo, o amor é compartilhado por dois sujeitos autônomos, que repartem o mesmo “objeto” da paixão. A noite estrelada deixa de ser o mote para um pedido exasperado, e se torna o espelho de laços oscilantes numa miríade de possibilidades.


Stardust (Inglaterra/EUA, 2007)
Direção: Matthew Vaughn.
Com Claire Danes, Michelle Pfeifer, Robert De Niro e Charlie Cox.

8.9.07

A realidade excessiva

Quando ilusões formam entulhos imaginários de tempo perdido, entupindo sinapses que levam a cenários além do cotidiano, impedindo a passagem do presente contínuo e o salto mais que necessário sobre o futuro imediato – então se costuma dizer, detrás de lágrimas, dentro do tédio, que a vida se perde em desperdício.

Antes do desengano, que trata os focos da existência inflamada, a concentração de ilusões é tamanha a ponto de proporcionar as condições primárias da mudança. Do alto da alma saturada, a vista angustiante, percebida, inquietada, faz da busca mais distante urgente proximidade. O desejo básico ressurge, do esboço traçado enquanto inexistiam os vazios aglomerados.

Mais tarde, tudo o que se juntou é revisto sem o peso de paralisia persistente. Depois da vertigem, do enjôo e da cura, são os abismos que fazem a ponte.

Desperdícios, portanto, não se jogam fora. O sonho nasce do não possível, de um projeto negado em algum momento em toda a plenitude real. Desperdícios são excessos de realidade contra o plano de fundo da ilusão.

Há um desperdício em cada vislumbre do belo porque há um sonho retido no flagrante de cada olhar.

Há um desperdício no que é dito, pois em silêncio sussurra o insinuante cortejo da poesia.

No que esconde e desvela, no que corre e desacelera, no que apaga e acende, no que jaz e sobrevive, no que foge e abraça, no que espera e cansa, no que cega e desperta – há desperdício na sobra de todo mundo ideal.


A pele (Fur: An imaginary portrait of Diane Arbus, EUA, 2006)
Direção: Steven Shainberg
Com Nicole Kidman e Robert Downey Jr.

31.8.07

A noite do dia

Nem sempre o tempo e o espaço andam juntos para a apreciação da consciência. O caminho que não se trilha pode não ser associado a dias perdidos, ou a horas paradas. Assim como um minuto poupado não costuma ser acrescido à perspectiva de novos passos.

Mas se um relógio pára, a imediata imagem formada na mente é a de um mundo de estátuas e cenários congelados, como se acabasse a bateria que movimenta o real.

Para a imaginação, a realidade paralisada no tempo se ausenta apenas no espaço, contudo: até que o tempo volte a ser marcado – crono-metrado – quem permanece acordado possui todo o tempo do mundo. Aliás, quando se dorme, aonde vai o tempo enquanto ficamos no mesmo lugar?

O sonho devolve o que aparentemente se perdeu, ao produzir a sensação de que não estamos deitados de olhos fechados enquanto o mecanismo do mundo gira. Um mecanismo gigantesco, onipresente, que pode a qualquer momento alterar o sentido do que se percebe, ou a raiz do que se acredita, bastando para isso reconfigurar os moldes de uma verdade em suspensão. Ainda que haja controle, ainda que haja uma explicação que foge das mentes sob controle, não importa: o obscuro conforta ao subtrair do ser-tempo a angústia de ser consumido.

A luz do dia interrompe o sonho, arremessando a consciência, com violência, para o tempo implacável do espaço vivido. Porque a nossa compreensão do tempo – como de tudo – é imitação do que vemos, o ciclo solar é de nossa conta. Se há uma sombra perene sobre o ser que conta o tempo, é a sombra da era imperceptível antes e depois dele.

Uma longa noite de vigília pode ser tão desagradável que mesmo os orgulhosos entes noturnos recorrem ao esquecimento da sombra, fazendo de conta que não falta sequer uma gota de luz.

Por outro lado, o hábito diurno precisa sumir da própria vista nos braços da noite. Há um cansaço que não dá trégua ao abuso dos sentidos, e a lucidez é maior após o intervalo noturno.

O dia é carente de sonhos na mesmíssima medida em que o sonhador carece de luz.

Cidade das sombras (Dark city, Austrália/EUA, 1998)
Direção: Alex Proyas
Com Kiefer Sutherland, William Hurt e Jennifer Connelly.

2.8.07

O resto é ruído

O corpo não liga para a voz muda: pensamentos calados não passam despercebidos. Que silêncio impede a dança? Que música não se ouve, quando o bastante há para escutar? É no silêncio que se dança melhor, e a melhor dança é aquela que parece não ter necessidade do som.

A vida tagarela pode ser simples, transparente e bela, como ensinam os que têm os sentimentos articulados na pressa da língua de sinais. O gestual eloqüente disputa com o olhar a atenção da alma que não cabe no corpo – que não cala porque não sabe calar.

Quando falar é impossível, vemos o quanto dizer o que se quer é difícil, mesmo à voz menos trêmula, à sílaba bem coordenada. E o quanto é fácil dizer, com menos, o que falamos demais.

Diante de um mundo a cada dia maior, de informações plenas em profusão, a toda velocidade e a todo instante, a mudez soa logo estranha aos ouvidos acostumados à cacofonia. Mas por pouco tempo. De repente nos damos conta de que é a mesma linguagem, quase a mesma história, quase as mesmas pessoas com que topamos sempre, que apenas se comunicam diferente.

Falar é tão fácil e às vezes o que sai da boca era já tão explícito que, tem hora, renunciamos ao entendimento. Abandonamos o óbvio – justamente aquilo que não poderia ser abandonado. Certezas esquecidas ou aprisionadas, dúvidas escondidas à espreita, à espera da recordação, do resgate, da libertação pela mera repetição do óbvio.

Assim como a novidade que surge pode trazer o perfume de certa experiência vivida, a manifestação de linha redundante pode levar ao reconhecimento do mesmo, noutra face. Feito similar brilho em outro espelho, a revelar nova imagem à mesmíssima luz.

A compreensão pede a palavra, e a palavra pede o gesto em seu reflexo. Viver é selecionar signos e passá-los adiante. Para qualquer um? Não, eis a questão! É preciso encontrar o par de cada mensagem – no momento preciso – no imenso “jogo da memória” em que o dito e o não dito se fundem em toda voz.

Principalmente se o ser inteiro – além da fala – é essa voz.


O resto é silêncio (Curta, Brasil, 2003)
Roteiro e Direção: Paulo Halm
Com Paula Mele e Valdo Nóbrega.

22.7.07

O tempo do fogo


Queira sua parte logo, tudo a que tiver direito, porque a vida é consumida e logo está consumada. Entre o calor de que não se foge e o brilho que às vezes some, ponha a mão no fogo e ilumine a estrela perdida na noite mal-assombrada.

Queira o fogo brando na lareira que se prolonga, sem se importar se o conforto vem da mesma flama que desbasta. O tempo mata e protege, fere e cicatriza enquanto te forma e te retira de um bloco de matéria bruta concentrada. Somos esculpidos pelo tempo que passa – e fora do tempo, somos nada.

Tenha pressa com toda a razão de ser: o tempo dado custa mais caro do que se imagina. Como emprestar o que não se possui? Como pedir porção extra do que não há? Antes de se tornar pó, nutre a esperança sensata do lume buscando o ponto mais alto para depois – e só então – se apagar.

É como se coubesse, a cada um, adequado quinhão de pólvora, fósforos e cinzas. Na visão da centelha que és, tu encontras a sombra dos outros e podes não ver mais a tua. Sim, a meia-luz te tira o sono. O tempo é o fogo alimentado pelo oxigênio que vive.

Um fogo que se transmite, ensinou Gaston Bachelard, filósofo da ciência. Pra mim, pra você e todo mundo que a gente conhece, o fogo é a duração do ser. Nos teus olhos o tempo arde por um instante, soa eterno sob a respiração quente, ritmada pela brasa vermelha que pulsa no peito feito sol muito longe.

Na filosofia poética de Bachelard, o fogo é amor que se descobre. Assim o tempo é redescoberto, a vida consumida transforma aquela consumada.

Assim o fogo que se transmite é o tempo que se revela, e o ser consumido, da aurora ao crepúsculo, só pode ser percebido como tempo compartilhado.

Me and you and everyone we know (EUA/Inglaterra, 2005)
Direção e Roteiro: Miranda July
Com John Hawkes, Miranda July e Brandon Ratcliff.

16.7.07

Mais que um

Querer ser melhor por causa de alguém é arriscar o passo na direção oposta à costumeira, na esperança de acertar o rumo soprado pelo acaso. Acompanhar o vento que recorda à lembrança o primeiro sonho da consciência: “Acorda – sussurra – e vem brincar de não ser um”.

Retirar o mundo do próprio umbigo e reconhecer o que está em volta é um dos efeitos colaterais da surpreendente descoberta de que se é aquém do que se poderia. Descoberta à espera, verdade óbvia, revelada pelo ímpeto de se mostrar menos feio, de se enxergar menos tolo nos olhos que servem de espelho.

Querer ser melhor por alguém é não fazer do outro o centro do mundo. É descartar o peso de qualquer sobrecarga no chão. E aproveitar a leveza proporcionada pela sorte, não desperdiçar a chance de retribuir o gosto de ser leve, sem nenhum motivo.

Por algum motivo, atrelar a vida a uma outra como se entrelaçam mãos, não como se forçam correntes. Trazer à tona gestos que não se sabe de onde vêm – apenas aonde vão. Oferecer à outra vida o que não se tem, e por isso se pode doar, fartamente: o ser, indecifrado, que se vislumbra do lado.

Querer estar do seu lado sem se fazer notar, como se a solidão fosse capaz de permanecer igualmente oculta e repartida – solidão que se afirma enquanto se nega, compartilhada.

Querer olhar junto em direções diversas e ainda assim não se perder de vista, como se todo o cenário do mundo não bastasse para afastar um do outro do palco.

Querer sorrir enquanto se existe, sabendo que o sorriso que se divide é maior que um sorriso só.

Querer ir além do que se é porque diante de nova seqüência – seqüência outra, mais bela, quiçá de suma importância. Pois embora haja tanto desencontro, é pela arte do encontro que vale cada vida, como cantou o diplomata poeta.

Melhor é impossível (As good as it gets, EUA, 1997)
Direção: James L. Brooks
Com Jack Nicholson e Helen Hunt.

9.7.07


Se o mundo fosse um pergaminho muito antigo, cada vivente em seu tempo seria uma página reescrita à exaustão. Do nascimento até a morte, palavras amontoadas – e o silêncio entre elas – relatariam o drama, o tédio e as paixões de um indivíduo em sua prisão inata. Letras sobrepostas no palimpsesto do mundo dariam uma versão entre bilhões de versões no tecido de um pergaminho antigo.

Cada segundo gravado seria apagado pelo mesmo motivo que o teria gerado. Os indivíduos contariam a si as suas histórias, e buscariam do lado de fora a identidade que escapa no reduzido espaço em palimpsesta grafia.

Os entes inscritos se sucederiam como um som grave repetido com o objetivo de algo muitas vezes maior que um som repetido, como números marcados em papel tão usado quanto esquecido. Números rabiscados feito seres concebidos por magia, e prolongados até o fim que confere o único sentido possível.

O som emitido por cada indivíduo, entretanto, esbarra em outro indivíduo na cacofonia do antiqüíssimo pergaminho. As histórias não apenas se amontoam: elas se entrelaçam, estranhamente.

Pois não é um inferno, e sim um mistério, o que são os outros. A voz alheia é voz que confunde. O que o outro faz será sempre um caso de perplexidade para a consciência fugaz que o fita – talvez como monstro na escuridão, ou como um anjo luzente que fala, para lembrar Shakespeare.

Seríamos mensagens cifradas à espera de leitura, símbolos perdidos no vácuo de signos sem chaves espalhados nas faces ansiosas demais. Restaria apelar ao reflexo tênue dos contornos alinhavados antes, uma vez que o brilho ofuscante dos que são escritos com a gente não tem como ajudar tanto.

Palimpsesto gigante, a cada órbita o planeta teria novas histórias, como imaginou Carl Sagan. Pelas histórias contidas, a Terra parece algo além de um ponto minúsculo no pergaminho do universo. Pelas histórias que nos contam, lançamos a vista na direção de outras rimas, adivinhando as sílabas como se fossem de um ato nosso.

Se tudo não passasse de uma concha inóspita, a mente, sem alternativa, se inventava.

E se tu não existisses – a outra voz, uma outra palavra, monstro do escuro, anjo luzente – eu dar-te-ia forma, e uma janela bacana dentro da minha história.


Contato (Contact, EUA, 1997)
Direção: Robert Zemeckis
Com Jodie Foster e Mattew McConaughey.
Baseado no romance de Carl Sagan publicado em 1985.

3.7.07

O mundo no personagem

Decorre de um emaranhado impossível de ser visto, emaranhado de motivos e acasos, de ligações extensas e fios soltos, sem sentido, uma tarefa das mais difíceis ao ser consciente – inventar-se.

Na busca infinda pelo que não entende, para melhor conceber a si, retira do exterior o tênue véu da razão, e deste fino tecido se veste. Mas ao mirar-se no espelho toma um susto, logo se atemoriza, porque não se vê.

A razão refletida do mundo não serve de roupa para a consciência, destinada a ser invisível pela imagem que lança do mais próximo objeto existente ao mais distante: a consciência não se revela ao detalhe do microscópio, nem à luz da luneta.

Cada ser consciente é um personagem autor da própria história. Ao mesmo tempo em que se escreve, se perde, se esquece, se descola de um enredo. A história do autor-personagem só tem início quando termina, e só pode ter fim depois de começada.

Desconhecer o roteiro é a condição de ir em frente, embora não se dê um passo que não seja, passo estranho, resultante de ato deliberado na direção de algo que jamais se enxerga.

Por isso o mundo é da cor dos olhos de quem assiste, e a cor é a cor forjada pelo percebido. Trágico ou hilário, entediante ou mágico, feio ou estonteante – depende de como cada personagem se desenha, e por tabela desenha o mundo.

Sim, o mundo está dentro de cada ser consciente, assim como toda história habita o seu personagem.

Mais estranho que a ficção (Stranger than fiction, EUA, 2006)
Direção: Marc Forster
Com Maggie Gyllenhaall, Will Ferrell, Emma Thompson e Dustin Hoffman.

27.6.07

A força invisível

Balas são pedras que gritam e voam, lapidadas em série, recheadas de preto para semear a destruição.

Balas são pedras que cumprem ordens. Ordens que vêm de armas que não sabem de nada. As armas disparam no escuro balas perdidas e balas que acertam a direção do alvo desejado pelo gatilho. Mas quem puxa o gatilho também desconhece a origem da bala, como se o gatilho fosse invenção da arma, ou extensão natural da bala.

Quem compra a arma e a bala não puxa todos os gatilhos. Porém nunca faltaram braços para atirar pedras. E quanto mais leves e rápidas as pedras, menos braços faltam. Para os portadores de pedras rápidas, metalizadas, prontas para receber ordens, as armas significam menor esforço e maior demonstração de força.

A força da bala é um valor imenso atribuído a objeto diminuto, quase invisível. Tão invisível que o animal armado nem se dá conta dele, apenas da força que o torna simbolicamente indestrutível – e o que está em volta, absolutamente vulnerável ao movimento mínimo engatilhado.

O que se vê não é a bala. É o que sobra de sua trajetória. A bala é a força invisível que faz do gatilho um detalhe. E de quem dispara, um super-herói aos próprios olhos, e um fantasma aos olhos dos outros.

No entanto, balas não caem do céu, armas não brotam do chão.

As guerras são feiras fúnebres de armas, balas e corpos. Corpos de animais ensangüentados, a maioria deles desarmada. Supra-sumo da matéria quente, a matéria viva sucumbe à matéria fria da arma, ao fogo falso de um bólido. O cheiro ancestral da carne em sangue desfeita alimenta a ilusão do encontro selvagem, instintivo, com a natureza do animal humano.

Protegido pela sombra da munição – seja de pedras à mão, ou de balas lascadas a laser – o homem se desumaniza, armado até os dentes.

Diamante de sangue (Bloody diamond, EUA, 2006)
Direção: Edward Zwick
Com Leonardo Di Caprio e Jennifer Connely.

3.6.07

Quebra-cabeças

Começamos pelas bordas. É mais fácil identificá-las, ligar as extremidades para fechar a moldura. Os limites achados dão-nos a sensação de dever cumprido, embora o interior do quadro esteja oco e tudo apenas começando.
As peças, do mesmo tamanho, nos confundem. Procuramos padrões além de sua forma semelhante – mas é noutras semelhanças, de cores e desenhos, que depositamos as esperanças. Grupos indefinidos são separados: céus com nuvens e céus azulados, os galhos e o tronco da árvore, ou as flores vivas de um Van Gogh estão à espera da descoberta, do desvelar-se, para que o nosso olhar reúna o que o tempo despedaçou.
Ao final restará uma tarefa, pois a figura inteira pede a distância. Será preciso abandonar o tato que juntou as peças para desvendar algum sentido no conjunto que se mostra de longe à visão.
Talvez não seja o resultado previsto nem desejado. Mas o que era mesmo que prevíamos ou desejávamos? Os modelos são ilusórios. O quebra-cabeças do tempo não tem um cenário-guia estampado na frente da caixa. São apenas as peças soltas que vão chegando uma a uma – segundos, minutos, dias – num fluxo incessante em que sempre faltarão peças, e sobrarão pedaços que não se encaixam e buracos sem solução.
E talvez, entretanto, quanto mais peças contamos mais se torne previsível o destino do tempo amontoado. Afinal as bordas já estão prontas, cada agrupamento em seu canto. Agora é juntar as partes, ver o azul no azul, o branco no branco, Van Gogh em Van Gogh.
O segredo das cartomantes e de todos que lêem adiante é compreender o passado que se posta à nossa frente tal e qual um quebra-cabeças montado – mesmo que não seja possível montá-lo completamente.

Premonições (Premonition, EUA, 2007)
Direção: Mennan Yapo
Com Sandra Bullock e Julian McMahon

1.5.07

Esboços

Era uma vez uma menina que gostava de contar estórias e desenhar bichos. Seu nome era Beatriz.
Os bichos falavam com ela e ela conversava com eles, e com os desenhos. Claro! Que autor não fala com os personagens? Qual criador abandona as criaturas à própria sorte? Jamais seria Beatriz.
A menina cresceu e virou uma grande autora de livros infantis.
A estória podia terminar por aqui. Mas quem pode resumir qualquer vida num esboço – a vida que leva a destinos que nem podemos imaginar?
Beatriz foi o esboço de si mesma até um dia: o dia em que foi publicada. E o livro pronto foi o esboço do que Beatriz queria dali em diante fazer.
Como a infância esboça os anos mais tarde, na preparação dos papéis, na experiência das tintas, na descoberta de formas e cores. Em cada criança o futuro brinca de agora sem a obrigação de acontecer. De mentirinha tão verdadeira que da fantasia aparece a centelha do que pode vir a seguir.
Em cada criança o futuro brinca de agora enquanto não chega a hora de achar no espelho um passado até então impossível de estar ali. O passado esboço do futuro flagrado no presente faz erodir a inocência divertida de ser o que não se era, para descobrir a velocidade com que se passa da imitação ao que se é.
Nenhum esboço fornece decerto o projeto daquilo que vem a ser cumprido. O bom dos rascunhos é a possibilidade aberta de sempre surgir outra coisa, além do que se vê, fora do que se previu.
Por outro lado, um esboço que se cumpre deixa de ser esboço para ganhar traços firmes, cores fortes, formas certas. É o tempo bem desenhado num caderno cheio de esboços e história pra contar.
Mas como Beatriz sabia, sempre há mais para desenhar: uma folha em branco convida o agora a brincar de futuro no esboço do que será.

Miss Potter (Inglaterra/EUA, 2006)
Direção: Chris Noonan
Com Renée Zellweger e Ewan McGregor

6.4.07

Sua vez



Ela não compreendia e não havia o que explicar, mas não se podia evitar um pouco de contemplação, susto, dúvida ou enternecimento à sua presença. Era como se fizesse, não o mundo parar (embora parecesse), e sim, acelerar, recuar e andar de acordo com o seu ritmo. Seu instante dominava os demais instantes: o tempo dela afetava o tempo dos outros.

Sua mágica era mostrar-se absurdamente real, sem precisar exibir-se. Algo se exibia através dela.

Algo digno de mirar-se por horas a fio sem que uma fadiga viesse. Que provocava torpor e inquietude, tão contraditório quanto efêmero e eterno, crucial e desimportante, enigmático e óbvio. E que produzia nos espíritos mais duros inegável apaziguamento.

A paixão declarada seria banal. Calar a poesia, que dela jorrava e para ela tornava, seria difícil. Na mudez atônita de uns e na eloqüência boba dos restantes ela desdenhava evidências da beleza que não via – e que sabia, assim, que não possuía.

Talvez tivesse razão. Aquele espécie de maravilha seminal, concentrada e viva, ninguém poderia “ter”. Ainda que todos pudessem “ver”.

Sua beleza era do tipo que não se repara, não se emenda, não se corrompe, nem se melhora. Que não se põe nem se tira, não está na roupa, na pele, nos pelos, no riso, na nuca, na voz, mesmo que neles se manifeste, como à revelia do corpo, a vida se mexe.

Era a vez dela. O esplendor tocou os que se aproximaram. Pura sorte: a beleza que ela não tinha mas era perceptível como vento no rosto trazia mudanças. Uma dor aguda se amainava. Algum equívoco se extirpava. Sonhos se recuperavam ou se fechavam. Cálculos foram refeitos. Certezas se afrouxaram. Esperanças, renovadas, se empilharam.

Aos olhos que seguiam os seus, sorria sem prestar atenção. Um dia tudo terminaria, e ela se juntaria à busca da multidão.


Beleza roubada (Stealing beauty, Itália, 1996)
Direção: Bernardo Bertolucci
Com Liv Tyler e Jeremy Irons.

30.3.07

Lente de aumento

A realidade está por trás dos olhos de quem vê – e não adiante, na cena iluminada pela lente da mente. É a parte mais visível da ficção, para Affonso Romano de Sant’Anna.

A ficção, nem sempre exposta, espontânea, no real, encobre o palco do mundo aberto a cada um. Do meu ângulo ou do teu, vemos porções de um cenário cuja totalidade sempre nos escapa.

Daí a função do que inventamos para preencher as lacunas daquilo que mal enxergamos. O desejo de saber é extensão inexorável do olho. Mas se o olho é frustrado, se fecha, e dá asas à imaginação.

De Platão a Matrix, os limites da realidade são transpostos pela razão – que filosofa ou fantasia, angustia-se ou se diverte de acordo com a distância em relação aos pontos que servem como cardeais.

Em uma parada qualquer entre a loucura e a lógica, a ficção é uma rota de fuga breve e leve. O mundo fictício é tão real que soa melhor que a realidade – tanto mais quanto os fios do real se confundem num emaranhado de imagens, meios e mensagens.

Possibilitada pelo caos de onde irrompe a ordem, pelo silêncio do qual emerge a fala, a ficção nos fascina ao ponto de parecer maior que a sua própria origem.


Lucia e o Sexo (Lucía y el sexo, Espanha/França, 2001)
Direção: Julio Medem
Com Paz Veja, Elena Anaya e Najwa Nimri.

29.1.07

A descoberta da diferença

Pode ser que as paixões não sustentem nada porque a matéria condensada de que são compostas evapora-se com o tempo e não deixa pistas do edifício de sonhos projetado em transe, quando a paixão é sólida como o corpo que surge mágico das brumas da multidão.

Pode ser... Mas e se não for? E se do romantismo rarefeito venha um castelo concreto de inimitável beleza transformado na adorável prisão das relações longevas, transparentes como a alma que salta do olhar do outro em muda conversação?

Pode ser que as bobices românticas não mostrem mais que espíritos em convulsão na dependência de uma âncora viva e atenta fora de si, sintoma de doença benigna causada pela pregação convincente da tradição cultural que cultiva a busca de uma realização impossível como fantasia vital.

Pode ser... Mas e se não for? E se no meio da ilusão embasbacada se ache algo alheio à ilusão, tipo a surpresa de alguém que não apenas não se importe com a fabricação virtual como desconheça e saúde os obtusos motivos que unem as pessoas em ligações consistentes após inefáveis aproximações?

Tudo pode ser ou não ser na seara das relações. Contudo “ser ou não ser” aqui não é a questão. Apaixonar-se tanto é forma de queda quanto sinal de elevação no reino breve dos mortais.

Por isso, apaixonar-se é principalmente desfazer-se da crença melancólica de que somos todos iguais perante todos os demais.


O amor não tira férias (The Holiday, EUA, 2006)
Direção: Nancy Meyers
Com Cameron Diaz, Kate Winslet, Jude Law e Jack Black.

8.1.07

Fechado a sete chaves


Os olhos de um velho sem corpo aprendem a dizer muito, inclusive sobre o horror de enxergar de dentro de um corpo que parece não ser mais seu.

Enquanto isso, no espelho das almas que falam e andam, fantasmas assombram o corpo, desejam-no, como à sombra da vida paira a morte. Feitiços de proteção ou ataque erguem a fortaleza de um “corpo fechado”, ou abrem os portões de um castelo vulnerável.

Mas tem que acreditar para que funcione. A fé precisa do corpo escravo. Precisa fazer do corpo engrenagem perfeita, encaixe de mecanismo invisível, peça medíocre de grande máquina imaterial. E apesar de tudo, com supremacia diante dos demais entes animados – matéria melhor que a matéria, o corpo humano submete-se ao incorpóreo.

Fazer do corpo objeto real e irreal, aparente e essencial, no limiar entre aquilo que toscamente percebemos e o que, além do corpo, imaginamos existir – eis o mistério da fé.

Calabouço da consciência ou “buraco branco no tempo” da matéria inanimada, como discorre o físico Peter Russell no livro com este título, o fato é que o corpo humano esconde um segredo trancado a sete chaves.

E ainda teme que a porta, aberta apenas pelo lado de lá, leve ao mundo sem fundo de um não-lugar, sem nada para olhar, onde nem luz haja mais.


A chave mestra (The skeleton key, EUA, 2005)
Direção: Iain Softley
Com Kate Hudson e John Hurt.

30.11.06

A sorte do encontro


Na face dos que se mostram vê-se às vezes o anseio de uma jornada perdida, frustrada ou inacabada – a jornada que se desenha na busca do outro. Que de forma geral, quase sempre se perde ou se frustra, e nunca parece ter fim, porque o outro que se procura não se define, não vem da soma das nossas expectativas, nem é o que sobra das desilusões.

A rede das relações humanas é confusa, e se complica ainda mais na teia cheia de tramas do tempo. Um prato feito para os contadores de histórias, com sabores e dissabores para quem as vive. E por isso, Vinícius: o encontro na vida é arte, já que a vida é desencontro. O poeta da paixão falava com a experiência da doçura e da amargura, de quem se encantava pelas pessoas tão facilmente quanto se desencantava – pelo menos, fosse infinito o encanto, enquanto durasse.

Então o encontro é sorte, ainda que seja arte prepará-lo, permiti-lo. O acaso ronda as “almas gêmeas”, mas você mora em São Paulo e eu, no interior da França! Ou você está ali na esquina, mas não tivemos a chance de um esbarrão de cinema, no lugar preciso, na hora exata. O encontro tem seu momento certo, onde é ingênuo e forte – ali ele é fruto da sorte – e o dia seguinte do encontro, menos ingênuo e mais fraco, onde o esforço é necessário, a arte sobressai.

O momento certo, contudo, não é o fortuito episódio. Está mais para uma conjunção de mistérios – dos astros, das nuvens, do ângulo da luz, daquilo que preferir – aliada a uma disposição dos espíritos que se cruzam e, de repente, se acham. O momento certo até dura, portanto.

Porém convém não tomar duração por eternidade, inclinação bem freqüente, acentuada defronte da sorte.


Você é tão bonito! (Je vous trouve três beau, França, 2006)
Direção: Isabelle Mergault
Com Michel Blanc e Medeea Marinescu
Destaque do 5º Festival Varilux do Cinema Francês
Em cartaz no Cinema da Fundação neste final de semana.

4.11.06

Na encruzilhada outra solidão



Em cartaz - O menino joga sozinho o futebol de botão. O velho acorda sem ninguém. O jovem picha os muros do país, um país que se distrai com a Copa na TV. A solidão dos encontros, muda, serena, o hábito e os costumes trazidos de longe, esquecidos na memória.

Enquanto é infinita, a infância sai recolhendo os indícios do mundo no afã de aprender, abandonando os restos percebidos sem pensar no tempo gasto no gesto repetido e no medo daquilo que nem vê.

A vida aberta em mil vias destoa da lentidão da velhice. A pressa é inimiga da idade que não tem prazo de validade porque hoje foi ontem, um agora remexido mal se livra do antes, e amanhã é mais distante que os dias que povoam o presente.

Durante a jornada, uma revolta se levanta contra a opressão e a vilania. Mas é só uma revolta no meio de tantas tiranias... Até que a liberdade tardia retorne, a diferença dá-se os braços e se defende como pode.

Nos idos da ditadura da história a ditadura do tempo promove abraços inusitados na encruzilhada da solidão. Outros olhares perdidos, outros temores na carne, outros consolos no coração. O estranhamento é idêntico, contudo, e se estampa na face da multidão que grita alto, a cada gol, como uma só voz – como se não fosse uma voz só.

O ano em que meus pais saíram de férias (Brasil, 2006)
Direção: Cao Hamburger
Com Germano Haiut, Michel Joelsas, Liliana Castro e Caio Blat

O grande fardo


Seguimos atrás de compensações diante do abismo acima de nós. O instante eterno de um piscar de olhos nos força a tecer inversas comparações, inventar opostos contra a solidão.

Sentimos que os olhos abertos não contam toda a verdade, tem que haver mais por trás do mundo visto-criado-pela-visão. Assim o que vemos não é real pois a realidade não vale quando não basta.

Queremos nos livrar do peso existencial. Construir algo que faça mais sentido que um universo tão silencioso quanto isolada parece a nossa posição nele. Queremos desfazer os mitos científicos e voltar a ler nas paredes frias da caverna os rabiscos que deixamos para nós mesmos.

Celebramos ora a prisão do corpo, ora a liberdade da alma – como se um não fosse livre e prisioneira a outra, vez nenhuma. A poesia concreta, tangível, abstraímos do mesmo mundo negado... Somos seres, sim, insustentáveis, não entendemos o que se passa.

Como a vida pode ser leve ante o peso de tudo, a nossa consciência do que gira em volta trata de esquecer uma consagrada irrelevância no concerto para trilhões de instrumentos que mal conseguimos escutar.

De repente, a morte. De repente, a lembrança: o sangue tem um caminho a trilhar. Cada organismo é matéria diferenciada em esforço insondável, ínfimo ato no meio de movimentos grandiosos (invisíveis) que nos conduzem de lá pra cá e de cá pra lá.

O problema é que a acolhida da consciência pela vida soa inexata e incompleta – a morte, vivida, dada à consciência, sempre é violenta, agressão gratuita ao ser que, em sua leveza, brincava.

Morrer, tal como matar o outro em nós, na morte próxima: esse é o fardo insustentável.


A insustentável leveza do ser (EUA, 1988)
Direção: Philip Kaufman
Roteiro: Jean-Claude Carrière, baseado no romance de Milan Kundera
Com Daniel Day-Lewis, Juliette Binoche e Lena Olin

27.10.06

Um preço alto demais


Acinte ao ciúme que cega, seus olhos se fecham para sempre após o vislumbre do assombro. Seu impetuoso sorriso se caricatura na face da morte brutal: o assassinato feroz rasga-lhe a boca, parte-lhe o corpo e lhe esvazia o sangue, como se isso bastasse para deformar a beleza. Na invasão do belo pelo atroz, a percepção desfigurada rearruma, pelo avesso, o real.

Aquilo que assume a perfeição é a soma ou ausência de valores idealizados. Sobre o olhar estranho que contempla antes o alvo da destruição, a máscara fúnebre de um sorriso morto é o retrato do choque de extremos que pode ser apontado como culpado.

Na ponta em que é soma, o perfeito é o equilíbrio que encanta, até apazigua os espíritos na busca da forma. Na outra ponta, em que é nada, a perfeição é desconstruída do mundo, sendo sua conquista um obsessivo exercício de subtração – de forma e conteúdo, signos e sentidos. Por isso a beleza clássica é simétrica, e o perfeito niilismo, feio desde a fonte, é a falta de parâmetros que nega a própria perfeição.

Em que medida o feio é afrontado, o disforme aviltado e a sombra, insultada, diante de seu oposto? Quando a imagem banida do espelho se reflete do lado de fora, a vida animada se recorda do torpe destino – ou simplesmente acende, dentro de si, a fogueira doentia da inveja que alimenta as chamas da frustração.

A mesma medida humana habita a paixão e a violência passional. E assim como a paixão pode criar raízes longe do objeto de desejo, os crimes bárbaros lidos como passionais nem sempre “se explicam” pela proximidade entre criminoso e vítima. Nestes casos, a beleza aparece como o estopim do ato insano e estúpido, onde a inocência paga o preço da existência – desde que seja bela.

A dália negra (Alemanha/EUA, 2006)
Direção: Brian De Palma
Com Mia Kirshner, Scarlett Johansson e Hilary Swank.